A bolha de AI
Não é novidade para ninguém que desde o lançamento oficial do GPT o mundo vem focando as suas atenções ao mercado de AI, a capitalização de mercado da NVIDIA dobrou em 2024, saindo do patamar dos 1.5 trilhões de dólares para 3 trilhões de dólares, o que deu à empresa a posição de terceira companhia mais valiosa do mundo e rumores falam que 70% dos funcionários da empresa agora são milionários.
Aqueles que estão na indústria de Venture Capital como eu, ou aqueles que estão mais envolvidos com o mundo empreendedor, com certeza devem ter reparado que o número de empreendedores se valendo da tecnologia (muitas vezes sem uma justificativa boa) como elemento ou core dos seus negócios, vem disparando.
O cheiro do hype está no ar! E muitos afirmam que o mercado está experienciando uma bolha. Eu concordo com essa visão e na edição de hoje do Descentralizando eu explico o porquê!
Os ciclos do mercado de semicondutores
Não é um exagero afirmar que a NVIDIA tem puxado grande parte do movimento de subida do mercado AI. E isso não é uma surpresa, a empresa vem mostrando uma crescimento de receita impressionante, fechando o primeiro trimestre de 2024 com um faturamento de $26 Bi, um crescimento de 262% YoY.
Esse tipo de movimento está tipicamente alinhado com os ciclos do mercado de semicondutores, que vão da escassez de chips à oferta excessiva.
Quando uma nova tecnologia que exige novos tipos de chips surge, a demanda cresce de maneira exponencial. Um grande exemplo foi o boom na demanda por chips para smartphones após o lançamento do iphone em 2008.
Contudo, atender aumentos significativos na demanda de chips não é uma tarefa fácil. Construir novas fábricas é caro e pode demorar. Nesse contexto de escassez, empresas que necessitam dos semicondutores tendem a construir estoques dos mesmos, tentando comprar o dobro ou até mesmo o triplo de chips do que realmente precisam no curto prazo. Um exemplo atual é a Meta que está estocando GPUs H100, o modelo mais utilizado para o treinamento de modelos de AI.
Qual é o problema desse movimento? Isso cria demanda artificial para o produto, subindo preços e aumentando a receita dos fabricantes de semicondutores. Contudo, investimentos são feitos na construção de novas fábricas para atender a demanda e um pouco mais, o que no médio prazo faz a escassez reduzir e a urgência/apetite para compra de semicondutores cair, criando uma excesso de oferta de chips e uma queda nos preços.
O aumento de competição também favorece esse fenômeno. Atualmente as Big Techs, os maiores clientes da NVIDIA estão começando a investir na construção dos seus próprios chips AI, como você pode ver aqui, aqui e aqui. O que pode levar os preços dos semicondutores para uma queda vertiginosa.
O hype
Generative AI e LLMS foram os triggers tecnológicos que nos trouxe ao atual momento de hype cycle de AI. Geralmente nesse momento as expectativas sobre o potencial da tecnologia estão nas alturas, fazendo com que o preço dos ativos relacionados a ela subam igualmente.
“We tend to overestimate the effect of a technology in the short run and underestimate the effect in the long run” - Amara, Roy
Isso aconteceu na bolha .com, com o mercado de crypto em 2021 (para citar alguns exemplos dentro do mercado tech) e provavelmente está acontecendo agora com AI. O ponto aqui não é que AI não seja uma indústria com enorme potencial de crescimento, mas que talvez o seu potencial demore para ser completamente explorado e que o mercado esteja super precificando esses ativos.
O hype leva a distorções. O Damodaran fez uma análise bastante lógica sobre o atual valor de mercado da NVIDIA e chegou a conclusão de que seria necessário que a empresa dominasse mais um ou dois mercados com o mesmo tamanho do mercado de AI para que seu atual valuation se justificasse. Estamos falando aqui de mercados de mais de $ 300 bi.
O importante de se ter em mente aqui é que basicamente seria necessário que a receita da empresa crescesse 10 vezes nos próximos 10 anos.
O problema do hype é que quando as expectativas de crescimento não são atendidas, o pânico se instaura, o que leva investidores a liquidarem suas posições, criando um efeito cascata que pode derrubar o mercado inteiro.
Uma conta de $ 600 bi que precisará ser paga
Empresas, especialmente as big techs, estão construindo grandes infraestruturas para dar suporte à evolução da AI.
David Cahn, da Sequoia, apontou um problema relevante. Cahn argumenta que a receita gerada pela NVIDIA com suas vendas na frente de Data Centers (majoritariamente de chips focados em AI) pode funcionar como um bom proxy para estimar a receita necessária que traria o breakeven das aplicações de AI. Considerando que aquisição de GPUs são 50% dos custos de se construir e operar um Data Center e que uma margem razoável para uma companhia de software seja 50%, podemos estimar que a receita necessária para equilibrar a operação seja de $600 bilhões.
Atualmente a empresa que vem gerando maiores receitas com consumer facing AI Apps sem dúvida é a OpenAI, que reportou em Junho uma receita anualizada de $3,4 Bi. Mas OpenAI não é o único player, ainda existem as receitas vindas denAI das big techs, certo? Mesmo se fatorando as big techs na equação, esse parece um gap bem grande para se cruzar. Algo em torno de $500 bilhões.
Obviamente isso é um investimento em infraestrutura que pode ser diluído pelo tempo. O que faz com que após alguns anos o investimento se pague, certo? Bom, a princípio esse pode ser um bom argumento. Mas vale lembrar que novos chips estão sendo lançados, como o B100 da Nvidia que apresenta uma grande evolução em termos da relação custo/performance, o que pode gerar uma nova corrida para se comprar e estocar chips, aumentando ainda mais os custos. Apesar de isso ser um indicativo de que a bolha AI ainda tem fôlego para crescer, também pode significar um maior estouro.
A segunda questão refere-se ao aumento de eficiência gerada por AI. Os CEOs de diversas empresas estão sofrendo a pressão de terem que se posicionar e agir sobre o tema. AI é o assunto do momento e isso é verdade também para o board das empresas. Todos estão com medo de ficarem para trás nessa corrida. Contudo, quando os resultados não aparecerem, seja por uma expectativa além do que a tecnologia pode oferecer atualmente, ou por falta de capacidade interna nas empresas, não vai ser incomum escutar (e isso vai acontecer) de CEOs de grandes empresas o discurso: “Acreditamos no potencial da tecnologia. Porém, enquanto não tivermos certeza que teremos ROI dentro do período de um ano, vamos segurar os investimentos.”
Pensamentos finais
Acredito que tentar encontrar o timing do estouro da bolha não é produtivo, os mercados estão sujeitos a diversas variáveis aleatórias que tornam uma previsão precisa uma tarefa praticamente impossível. Contudo, o que é produtivo é olhar para o que vem depois da bolha. AI é uma tecnologia que vai perdurar e provavelmente vai trazer uma nova onda de revolução tecnológica.
Os players que se posicionarem dessa forma serão capazes de surfar nesse novo mercado e poderão investir no futuro. A bolha .com nos mostrou isso, apesar do hype, as soluções com fundamentos perduram e constroem valor.
Um raciocínio que acredito que deve ser feito é que a proposta principal por traz de AI é a de ganho de eficiência operacional e portanto de melhores margens. Contudo, essa premissa só é válida no curto prazo. Com o passar do tempo, a tecnologia será cada vez mais comoditizada, fazendo com que todos os players também a implementem. Assim, se todos têm melhores margens, a competição inevitavelmente levaria a preços mais baixos o que, por sua vez, reduziria a margem novamente aos valores históricos. Em outras palavras:
Se todo mundo tem, ninguém tem!
Ao meu ver, quem se beneficia nessa corrida sem dúvida são os players que estão puxando a construção de novos modelos e aqueles que conseguem se beneficiar fortemente de “first mover advantages”, construindo alto custo de substituição e fortes efeitos de rede.
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Animal!!!